Sector procura reafirmar importância, apesar da incerteza

O ambiente pandémico continuará a marcar 2022, criando incerteza quanto ao rumo da economia nacional e europeia, mas as tendências de aceleração digital criam novas oportunidades para a área da contabilidade. As ferramentas inovadoras adotadas no último ano permitem aos profissionais da área focar-se mais no acompanhamento legislativo e no aconselhamento aos clientes, que pode constituir um motor para a maior valorização do papel dos contabilistas.

1. Quais os grandes desafios da contabilidade em 2022?

RUI PEDRO ALMEIDA, CEO & Managing Partner, Moneris

Julgo que a profissão e o sector enfrentam um conjunto de desafios que se vêm intensificando ao longo dos últimos anos, com redobrada incidência no atual contexto pandémico. Destacaria três desses desafios, como os mais relevantes: um primeiro desafio, a atração e retenção de talentos.

A profissão está envelhecida e assiste a um êxodo de profissionais que procuram uma ocupação menos exigente em termos de ocupação de tempo e responsabilidade. Em simultâneo, verifica-se uma escassez de novas pessoas a entrarem nesta carreira profissional, deixando evidente uma escassez de recursos que tende a acentuar-se com o passar do tempo. Em segundo lugar, a qualificação dos profissionais. Assistimos a mudanças rápidas e irreversíveis na profissão, com a necessidade de termos pessoas que possuam um espectro mais alargado de competências, seja ao nível da gestão, da área financeira, da fiscalidade e, sobretudo, da tecnologia. O reskilling e upskilling de profissionais é assim um tema na ordem do dia, condicionando a capacidade de responder às exigências do mercado e às necessidades dos clientes. Por fim, a transição digital e tecnológica. Este será porventura o grande desafio e oportunidade do sector. A digitalização exigirá investimentos significativos por parte das empresas, novas abordagens de negócio, sistemas e processos de trabalho, libertando os contabilistas para um papel cada vez mais de consultor (para o que será necessário a obtenção das acima designadas novas qualificações), acelerando a produtividade e permitindo responder às necessidades e expectativas dos clientes e do mercado.

TIAGO DIAS Partner, Baker Tilly

Os Contabilistas e as Sociedades de Contabilidade têm grandes desafios para 2022, tendo em conta o atual cenário pandémico e incerteza política. O desenvolvimento tecnológico continua a dinamizar a profissão. Estes investimentos, permitem aceder a ferramentas mais sofisticadas de digitalização, automatização e melhorias profundas no reporting, através da sua qualidade e rapidez no tratamento de dados. Desta forma, as sociedades de contabilidade alargam as suas áreas de conhecimento e criam novas oportunidades de crescimento. É crucial haver uma estratégia relativamente à segurança. O cibercrime é uma realidade em todas as empresas, que põe em risco a exposição de informação privilegiada, que poderá condicionar o sigilo profissional e inclusive a continuidade do próprio negócios dos clientes. É fundamental a aposta na proteção informática dos dados para evitar a ocorrência destas situações.

É inevitável o contabilista acompanhar esta mudança, bem como a sua própria disrupção intelectual. Neste sentido, o contabilista deve estar a par das novidades fiscais, legais e empresariais, por forma a validar toda essa informação, dando aos gestores e utilizadores das demonstrações financeiras uma análise aprofundada das diversas matérias. Para tal, os contabilistas devem ter uma forte aposta na formação e transmitir este conhecimento junto dos seus clientes. O capital humano é o sucesso de qualquer consultora. É importante reter talento e responder às expectativas de cada trabalhador com sistemas híbridos de trabalhos e quadros remuneratórios atrativos. É imprescindível manter o nível de serviço contratado para criar valor junto dos clientes, e assim construir uma relação duradoura com a prática de honorários justos. São vários os fatores que determinam o sucesso da atividade da contabilidade, uma profissão de prestígio que deve ser levada a cabo com a maior dignidade e que se deve pautar sempre pelas normas legais e princípios contabilísticos em vigor

LUÍS BATISTA, Partner, Head of Outsourcing, Mazars em Portugal

Alguns dos grandes desafios da contabilidade mantêm-se e não estão resolvidos, não é por não serem novos que não merecem destaque. Aliás, será por não estarem resolvidos ao longo de anos que o merecem. A literacia financeira de parte significativa dos pequenos empresários que, como sabemos, são a esmagadora maioria, o que tem sido benemeritamente considerado como demonstração de empreendedorismo e não como incapacidade de agregação, tem vindo a melhorar, mas é ainda insuficiente. Termos melhor e mais completa e tempestiva informação financeira para utilizadores que a utilizam, ainda numa escala reduzida, é um desafio que não pode ser esquecido, não obstante não ser recente. Outros desafios, resultantes do ambiente pandémico, decorrem de alguns processos e tarefas não críticas terem sido sistematicamente adiados, pelo que terão agora de ser recuperados, redefinidos ou até abandonados. A isto acresce que a flexibilização de alguns prazos declarativos obrigará, em algum momento, a uma recuperação temporal na produção de informação e cumprimentos de obrigação declarativas. Por último, mas não menos importante, os novos relatos de natureza ambiental ou de sustentabilidade, entre outros, terão de continuar a ser incorporados no processo de gestão de informação, sendo que na grande esmagadora das entidades a criação de equipas especializadas não será possível, pelo que serão as equipas de contabilidade, em muitos casos externas, que terão de continuar a evolução para agregar mais informação, com tratamentos e

stakeholders distintos e com impacto direto no que terá de ser uma evolução rápida para o controlo e relato dos impactos da atividade económica em termos não financeiros. Tanto como a formação a sensibilização dos profissionais da área, e consequentemente das organizações em que prestam serviços, é determinante para que também a contabilidade esteja ao serviço do que tem de ser um objetivo permanente, também este sistematicamente menosprezado e adiado. O de enveredarmos por um caminho sustentável...

RUI ALEXANDRE CARVALHO, Partner e administrador, Axioma

Após um período (pandémico) conturbado, para o qual não há ainda uma certeza sobre o horizonte temporal que nos permita efetivamente regressar a uma “normalidade”, haverá seguramente vários desafios a ter em conta para a contabilidade em 2022.

Entre eles destacamos a reorganização do trabalho, mais concretamente na intensificação do regime de teletrabalho, e na adaptação tecnológica a novos requisitos relacionados com esta realidade.

Todas as mudanças ou alterações que esta pandemia gerou, quer a nível profissional, quer pessoal, implicaram uma transformação profunda e significativa em vários aspetos, que vão desde o relacionamento interpessoal, ao trabalho à distância, às ferramentas tecnológicas, aos processos e procedimentos, etc. De igual forma, toda a gestão e interação com clientes e colaboradores, sem esquecer os demais stakeholders, requer agora uma abordagem muito mais diversificada, criativa, ágil e dinâmica.

Adicionalmente, todo este “novo” formato de trabalho, obriga a um maior controlo da segurança dos sistemas de informação e tecnologias utilizadas nos diversos relacionamentos à distância.

O sector da contabilidade está a mudar de forma extremamente rápida e a adaptação dos Contabilistas Certificados às oportunidades tecnológicas será sem sombra de dúvida relevante para a obtenção de uma posição de vantagem mais competitiva. A atual digitalização e automação de processos está recorrentemente a alterar vários paradigmas, e a velocidade com que os mesmos ocorrem seguramente continuará a configurar mais um excelente desafio para os prestadores de serviços de contabilidade para 2022.

JOSÉ PEDRO FARINHA, CEO, Viseeon Portugal

Os grandes desafios da contabilidade para 2022 prendemse com a perceção da importância e do valor acrescentado ao utente da informação financeira.

Hoje em dia, os contabilistas concentram grande parte do seu esforço no processamento da informação e no output fiscal da mesma, consumindo uma parte significativa do seu tempo em preenchimento de declarações fiscais e parafiscais.

O contabilista tem que assumir de uma vez por todas o papel de consultor, de organizador ou até embaixador de informação útil para o suporte à decisão, esta informação deve ser ágil, completa e compreensível. Há muito tempo que a contabilidade deixou de ser um sistema numérico de classificação da informação dentro de um código de contas, hoje a contabilidade assenta em dois paradigmas que se complementam, a base económica das operações e a utilidade da informação, o que permite um conjunto significativo de opções quando se fazem juízos de valor sobre o reconhecimento das operações na contabilidade, isso implica que o consultor (contabilista) tenha conhecimento do negócio em questão e tempo para pensar qual o melhor enquadramento contabilístico. Então o desafio passa por termos contabilistas sempre atualizados, habilitados e conhecedores das evoluções legislativas e digitais, acompanhar a transição digital é essencial de forma a libertar tempo de tarefas administrativas e redundantes para que se possam concentrar na análise da informação e na discussão da mesma com os decisores. Assim, a contabilidade passará a assumir o verdadeiro papel da linguagem dos negócios em vez de assumir o de coleta dos impostos. Sendo que o papel da segurança fiscal e da análise das melhores opções fiscais continuarão sempre a assumir-se muito importantes no trabalho dos contabilistas, mas mais uma vez na reflexão e análise normativa e não no cumprimento de obrigações declarativas.

O desafio será mesmo esta mudança paradigmática relativamente à profissão, com implicações significativas na forma de estar, na forma como formamos e qualificamos os nossos recursos, na forma como escolhemos os investimentos necessários para tirarmos partido da tecnologia, e da forma como asseguramos a perceção de valor criada pela consultoria em contabilidade.

InJornal Económico

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